SAÚDE E QUALIDADE VIDA:
"Tratar mente e corpo é a solução para bom resultado"
ENTREVISTA: Dr. Marcelo
Dratcu Incentiva Terapia Comportamental
“Sou um médico
clínico-geral que trabalha com a mente e o corpo, da parte emocional e
física.” Assim se autodefine - o Dr. Marcelo Dratcu. Formado em Medicina
pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e com residência em
Medicina Preventiva e Social, enveredou pela medicina comportamental por
acreditar que só assim seria um médico completo. Atuou no Instituto de
Medicina Comportamental do Departamento de Psicobiologia da Unifesp, onde
começou a trabalhar com transtornos da ansiedade, fobias e técnicas de
relaxamento.
Recentemente, lançou o livro Porque não me disseram isso antes?! em que
busca estimular o leitor a desenvolver mecanismos para enriquecer sua
qualidade de vida e produtividade no trabalho. “Falo de saúde e
produtividade, porque esses assuntos esta interligado ressalta.
Especializado em Terapia Comportamental Cognitiva, defende o tratamento como
uma alternativa em casos de distúrbios psíquicos. Pesquisa da Universidade
de Harvard, nos Estados Unidos, revela que anualmente mais de 1 bilhão de
dias de trabalho são perdidos por problemas psiquiátricos, principalmente a
depressão. Nesta entrevista, Dr. Marcelo orienta sobre a melhor forma de
identificar e tratar esses transtornos. “Precisamos tratar mente e corpo
para ter um bom resultado”, afirma.
Em sua visão, quais são os
caminhos prioritários para o médico do trabalho em relação à identificação
de distúrbios psíquicos em seus pacientes?
Dr. Marcelo Dratcu — Tem-se dado muita atenção às doenças ocupacionais, que
são causa de perdas muito grandes. Mas, às vezes, comportamento e problemas
de comunicação e de relacionamento não são pesquisados. Podem ter a ver com
o humor do indivíduo, sintomas depressivos ou de desgaste emocional,
ansiedade, dificuldade de se relacionar. São problemas que geram muito
prejuízo na qualidade de vida e também financeiro para a pessoa e para a
empresa, mas que não são pesquisados. Hoje, por estudos, sabe-se que as
maiores causas de incapacitação para o trabalho no mundo são problemas
osteomusculares, músculo-esquelético e, especialmente, depressão. O
funcionário não está bem psicologicamente e a atenção está toda voltada para
a saúde física dele. Minha primeira sugestão é estar alerta a esses
problemas e tentar avaliá-los melhor.
De que forma o médico do
trabalho deve orientar a sua visão para identificar os trabalhadores mais
vulneráveis a desenvolver esses distúrbios?
MD — Em primem lugar, deve ter a suspeita de que isso pode ocorrer. O que
acontece muito é achar que esses comportamentos são naturais e, às vezes,
não são. Pode ser um transtorno. Depois, o próprio individuo não percebe o
seu estado. Então, a informação vinda de colegas, do departamento de
Recursos Humanos, de familiares ou de amigos é muito importante.
Como diferenciar quais
transtornos estão relacionados ao trabalho e quais são provenientes de
outros fatores?
MD - O trabalho é um fator de risco de adoecimento físico e mental, como o
são os fatores de risco comportamentais, genéticos ou de estilo de vida. Nem
sempre é fácil compartimentar e dizer: “Olha, isso é causado pelo trabalho e
isso não é”. Geralmente há uma associação de fatores. O ideal é uma
avaliação médica e psicológica individual. Assim se consegue botar os pingos
nos “is”. Não tem muita escapatória. Tem que entrar em um tratamento
personalizado.
Qual é o perfil mais
vulnerável a desenvolver transtornos psíquicos?
MD — As pessoas que trabalham com atendimento ao público podem ter um fator
de risco a mais para ansiedade e depressão. Alguns dados da Inglaterra
sugerem que gestores, diretoria, gerência e presidência têm: mais chances de
desenvolver problemas cardiovasculares. E as mulheres, em geral, por
trabalharem não só fora, mas também por cuidarem da casa, têm alterações
relacionadas ao sistema reprodutivo e parecem mais suscetíveis á Síndrome de
Burnout.
Existem sinais não-verbais
aos quais o médico deve estar especialmente atento?
MD — Sim, a não ser que o trabalhador seja muito dissimulado, finja estar
bem, em geral, temos alguns sinais que são bastante interessantes. Um é a
expressão facial da pessoa. Pode estar com um olhar melancólico, uma testa
enrugada, os dentes cerrados, sinalizando uma depressão, uma ansiedade ou,
eventualmente, raiva e impaciência. Uma pessoa muito ansiosa não consegue
ficar parada, relaxada e sentada. Ou ainda ela pode estar letárgica: a
postura e os ombros caídos, uma movimentação muito adinâmica, muito lenta,
sem energia ou humor. São todos sinais importantes. Se o trabalhador
freqüenta o Departamento de Medicina do Trabalho e o médico percebe que há
alguma coisa errada, deve ser encaminhado para uma avaliação, porque ele
pode ter um valor muito grande na produtividade da empresa. Bem tratados os
transtornos, o perfil como trabalhador fica ótimo.
Nesse contexto, uma
alternativa seria a Terapia Comportamental Cognitiva (TCC)? Como ela pode
ajudar?
MD - É um tratamento simples e breve, que visa, entre outras coisas, alterar
comportamentos, preparar melhor a pessoa para lidar com o estresse, a
ansiedade e os sintomas depressivos. Então, você adapta o estilo de vida da
pessoa para uma forma mais saudável. E um tratamento com começo, meio e fim.
A média de duração vai de quatro a vinte semanas. para lidar com as
situações estressantes e com o aspecto emocional. As vezes, é necessário
introduzir medicação e, em outros casos, só com as técnicas cognitivas
comportamentais, de relaxamento, a pessoa consegue se livrar dos sintomas
ansiosos e depressivos. Pode ser um tratamento associado, complementar e, em
alguns casos, a terapia pode ser feita em forma de cursos em grupo e
aplicada junto com o tratamento do médico do trabalho.
A globalização alterou
muito as relações de trabalho. De que forma o senhor avalia o impacto disso
na saúde mental dos trabalhadores?
MD — Falando dos distúrbios psiquiátricos especificamente, acho que a
globalização, as pressões por resultados e por prazos, a pressa e o acúmulo
de informações são um gatilho que pode desencadear transtornos
psiquiátricos. Os problemas gerados pelo trabalho, principalmente agora, com
a globalização, precisam ser sanados inclusive no aspecto organizacional. As
empresas devem ter uma estrutura que comporte obter resultados e
produtividade sem passar dos limites do seu funcionário. Acontece que as
pessoas estão andando no automático. Tanto os profissionais de saúde, quanto
os empregadores e os trabalhadores. Não param para fazer uma auto-avaliação.
Devemos lembrar que existem outros fatores predisponentes, como o genético.
Outro é o estilo de vida fora do trabalho. Insônia, problemas familiares e
vida pessoal também são fatores. O certo é ter um equilíbrio entre a vida
pessoal e a profissional. Não só é possível encontrar esse equilíbrio entre
a realização pessoal e a profissional nos dias de hoje, como totalmente
necessário. É aí que a produtividade da empresa aumenta.
Muitas vezes, os próprios
médicos do trabalho se sujeitam a condições severas de trabalho. Conto o
profissional pode verificar os próprios sinais do corpo dele?
MD — O médico do trabalho tem duas características fundamentais. Primeiro,
ele é médico. Então, às vezes, trata dos outros e não trata de si. Segundo,
por ser médico do trabalho, ele vê as no paciente, no trabalhador, mas não
identifica nele mesmo. Ele está trabalhando muito, está vendo outras pessoas
e não está conseguindo fazer uma auto-avaliação, detectando em si mesmo os
problemas. O trabalho médico é um dos mais extenuantes e estressantes que
têm no mundo Ainda mais pela questão de lidar com pessoas, o que já é um
fator de risco para o estresse no trabalho. O médico deve fazer uma
autovigilância. Não pode ter constrangimento e deve seguir todos os passos
dos funcionários a que atende: fazer check-up, ter uma vida saudável,
praticar atividade física, entre outros.
Outras informações-
Sociedade Brasileira de
Terapias Cognitivas
www.sbtc.org.br
Porque não me disseram isso
antes?!
www.editorasaraiva.com.br/saraiva |